Por Ricardo Latgé*
Na última década, a discussão sobre mudanças climáticas ganhou contornos passionais. Adotada agora pela grande mídia, o reducionismo escolhido na atual abordagem catastrofista ambientalista abandona outras agendas altamente relevantes e indissociáveis se estamos, de fato, preocupados com a preservação do planeta e o bem-estar da atual e das futuras gerações. Por exemplo, a imperativa necessidade de eliminar o arsenal atômico; de reverter a lógica consumista; de ter como primazia o transporte público sobre o individual; e de pôr fim à miséria e à fome, o que imporá equalizar o uso de energia entre todos os cidadãos do planeta.
Naturalmente esse futuro mais harmonioso da Humanidade demandará a expansão do uso de todas as fontes de energia, inclusive as fósseis, reservando a estas um percentual progressivamente menor na matriz energética em favor das renováveis e da nuclear. Também exige a realização da compensação por parte dos países desenvolvidos no esforço da redução das Emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE), porquanto sua contribuição histórica e por serem os maiores consumidores energéticos per capta.
Em meio a esse debate coloca-se a questão sobre a continuidade da prospecção e o aproveitamento do petróleo das bacias sedimentares brasileiras, tendo como polêmica mais recente a perfuração de um poço pela Petrobras a 500 km de distância da Foz do Amazonas. Não raro, aponta-se para uma aparente contradição do Governo Federal: “para poder parar de poluir, vamos poluir mais?”. Será este dilema real? Será que devemos vagar com a “dúvida” de imputar ao petróleo a responsabilidade de catástrofes climáticas, como a que se abateu sobre o Rio Grande do Sul? Acreditamos que não!
Primeiro porque à luz da “Teoria do Caos”, não é razoável imputar a um único fator a ocorrência de fenômenos catastróficos, já que variáveis imponderáveis, algumas de diminutas magnitudes, podem levar a resultados surpreendentes em sistemas dinâmicos.
Observando os números de 2022, relacionados às emissões de GEE no Brasil1, constatamos que as atividades de Exploração e Produção de petróleo e de Refino contribuíram, cada uma delas, com somente 1% do total das emissões. São valores irrisórios frente aos 48% associados à Mudança de Uso da Terra e Floresta, e 27% da Agropecuária2 (Fig. 1). O mapa mostrado na figura 2 não deixa dúvidas de que está no campo o desafio da redução das emissões, notadamente por meio do combate ao desmatamento.
Detalhamento da origem das emissões de GEE3
Emissões de GEE por estado
A contribuição do transporte na emissão de GEE também é relevante, 18%. Este é um segmento que se adotadas políticas públicas que preconizem a opção pelo transporte de massa e qualidade nas cidades brasileiras poderemos dar uma contribuição rápida para a redução das emissões, além de educar a sociedade para a preservação do planeta apoiado em soluções coletivas.
O Brasil tem uma matriz energética das mais limpas do mundo, sendo 55% a contribuição de fontes Não-Renováveis, bem menos do que os 85% da média mundial4. Não passa de 3% o volume de suas emissões de GEE5e somos 2,7% da população global6. No entanto, em termos de consumo de energia “per capita”, um indicador de qualidade de vida, o país estava no 85º lugar, em 20207, parâmetro este que não espelha a desigualdade existente entre os lares brasileiros.
Os dados mostram, portanto, a necessidade de o país ampliar oferta energética se desejamos integrar amplas parcelas da população ao benefício do consumo de energia e o bem estar social. Este desafio não será alcançado se o Governo Federal excluir a contribuição do petróleo, bem como não ter como meta a redução do preço do Kwh ao consumidor residencial.
Nesse contexto, avançar na pesquisa da margem equatorial deve estar entre as prioridades da Petrobras, mormente porque lá existe uma fronteira exploratória cujo Sistema Petrolífero é pouco compreendido. E nada melhor do que a estatal à frente deste processo, posto que há muito nos orgulha por sua competência técnica e absoluto compromisso com a agenda ambiental. O Polo de Produção de Urucu, no meio da selva Amazônica, é um notável exemplo de como se fazer a exploração e produção de um bem natural numa floresta tropical. Infelizmente, este caso de sucesso é pouco conhecido pelos brasileiros e esquecido pelos contumazes detratores da estatal.
Não será diferente o zelo da Petrobras caso a volte a perfurar na Foz do Amazonas, ou em qualquer outra oportunidade em bacias sedimentares no território brasileiro, ou alhures. O condicional colocado na frase se justifica porquanto, como não poderia deixar de ser, historicamente essa estatal sempre teve o enorme respeito para com órgãos públicos da estrutura do Estado brasileiro. Não foram poucas as situações em que alguns deles estiveram inicialmente em posições diferentes e a integração de competências técnicas e o interesse nacional permitiram a convergência na decisão tomada.
Resta por fim que há ainda um desafio imperioso para alcançar esse objetivo – recuperar a política exitosa implementada nos primeiros 15 anos do século XXI, baseada na ousadia da Petrobras, que a levou a avançar sobre novas fronteiras exploratórias e legou a descoberta do Pré-Sal. Tudo isso foi posto por terra em menos de cinco anos, acompanhado pelo desmonte criminoso das empresas de Engenharia brasileiras.
O ganho de escala oferecido pelo enorme volume de reservas descobertas no Pré-Sal permite recuperarmos a ocupação plena de estaleiros e da indústria em geral. Oferece ainda a garantida de insumos para a expansão do parque petroquímico, recuperar a integração da academia e centros tecnológicos ao esforço de produzir esta riqueza, gerando centenas de milhares de empregos de qualidade no Brasil.
* Ricardo Latgé, geólogo, é diretor institucional do Clube de Engenharia.
Comments