Por Miguel Manso
O Banco Central do Brasil (BCB) é uma instituição crucial para a estabilidade econômica e progresso do país. Hoje porém, tornou-se o maior obstáculo ao seu desenvolvimento e à justiça social. O Tesouro Nacional era o órgão emissor de papel-moeda. Em dezembro de 1964, tudo muda em favor dos Bancos e a Lei nº 4.595 cria o Banco Central do Brasil, autarquia federal integrante do Sistema Financeiro Nacional (SFN).
A crise financeira de 1929 e duas guerras mundiais levara as nações a implementar a regulação do sistema financeiro e o Brasil cria a SUMOC - Superintendência de Moeda e Crédito
A SUMOC foi criada por Getúlio Vargas em 1945, como a autoridade monetária do país com a finalidade de preparar a criação de um futuro Banco Central. O órgão era subordinado ao Ministério da Fazenda e sua organização dividida em duas partes:
1) um conselho, que tomaria as decisões de caráter organizacional e sobre as políticas monetárias;
2) um grupo executivo, que iria operacionalizar os trabalhos da instituição e o que fosse decidido pelo conselho.
Na época, o principal objetivo da SUMOC era melhorar a estrutura e estabilizar o sistema econômico brasileiro. Precisava estabilizar o mercado financeiro, que lidava com um mundo pós-guerra, além de controlar o perigo de inflação no país.
Suas principais funções foram:
Reorganizar o sistema bancário;
Regulamentar e fiscalizar o sistema bancário, supervisionando a atuação dos bancos comerciais no país;
Orientar a política de câmbio (moeda estrangeira);
Promover a criação de estudos econômicos no país;
Representar o Brasil economicamente em âmbito internacional. Dentre toda a atuação da SUMOC, uma das principais foi ter regulamentado o comércio exterior brasileiro.
O DESMONTE NEOLIBERAL DA LEI ANTITRUSTE E A CARTELIZAÇÃO DOS BANCOS
O que é a Lei Antitruste? A Lei Antitruste (Lei 12.529/11) é um dispositivo legal que estabelece condições para a prevenção e repreensão a uma série de infrações contra a ordem econômica no Brasil, incluindo-se aí a formação de trustes, cartéis ou monopólios. A primeira vez que uma lei desse tipo foi criada aconteceu em 1962, durante o Governo de João Goulart, foi a Lei 4.137/1962, que criou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). A lei foi fortemente influenciada pelas legislações norte-americanas, vigentes desde o século XIX e aprimoradas após a crise de 1929, em que o governo do Presidente Roosevelt tomou medidas para enfrentar a cartelização nos EUA. Política e legislação que foi desregulamentada nos EUA e no mundo, alimentada pelo neoliberalismo, e que é a base das intensas crises das últimas décadas e levaram ao renascimento do neofascismo de hoje.
O órgão permaneceu estagnado até 1991, pois não era considerado eficaz já que encontrava várias barreiras de atuação no Poder Judiciário. Desse modo, impedido de agir, o CADE foi considerado por muito tempo como um órgão irrelevante. Assim, de modo geral, após a aprovação, a Lei 4.137/1962 foi praticamente esquecida por conta da Ditadura Militar, já que também não existiram preocupações por parte do governo em evoluir a legislação antitruste no Brasil – principalmente, porque o Poder Executivo, que controlava o Congresso Nacional no momento, não possuía interesse em criar esse tipo de combate à concentração empresarial.
Assim, foi somente a partir de 1988 que as políticas antitrustes, de fato, começaram a se desenvolver no Brasil. Na Constituição Federal de 1988, no art. 170, foi reconhecido como direito fundamental:
"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente;
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte."
O CARTEL DOS BANCOS REAGE NOVAMENTE E DESMONTA O QUE HAVIA SIDO CONQUISTADO PELA REDEMOCRATIZAÇÃO NA CONSTITUINTE DE 1988
Então, como a lei antitruste brasileira foi desmontada e reestruturada?
A Lei nº. 12.529, de 30 de novembro de 2011, dispõe sobre a estrutura do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, tendo como sigla “SDBC”.
De acordo com a lei, o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência é composto pelo Conselho Administrativo de Defesa da Economia (CADE) e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (SEAE).
Entretanto, de acordo com o Decreto n° 9.266 de 2018, assinado durante o governo Temer, a SEAE foi extinta, e duas novas secretarias foram criadas a partir do remanejamento de competências e cargos: a Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência; e a Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loterias.
Além disso, no Decreto n° 9.679, de 2 de Janeiro de 2019, assinado durante o Governo Bolsonaro, com a “extinção” do Ministério da Fazenda, foi criado o Ministério da Economia. Após isso, o Governo decidiu, com base nesse Decreto e no Decreto n° 10.072 de 18 de Outubro de 2019, substituir a Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loterias para a Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria.
A partir da criação do Banco Central, muito mudou para as entidades financeiras e bancos, que trataram de organizar seu cartel e definir sua ação para controlar o sistema monetário nacional e o BC.
Para começar, as contas do Banco Central, do Banco do Brasil e do Tesouro Nacional foram separadas e foi vedado ao Banco Central emprestar dinheiro ao Tesouro, direta ou indiretamente, obrigando que o Estado se endividasse nos Bancos do Cartel através da Emissão de Títulos da Dívida Pública (Obrigações da Divida Publica) com juros estabelecidos pelo "MERCAO", ou seja, pelo Cartel dos Bancos.
Por conseguinte, um novo passo na história do Banco Central dado foi quando as funções antes divididas entre as três entidades foram redistribuídas: as atribuições de autoridade monetária foram progressivamente passadas do Banco do Brasil para o Banco Central e a administração da dívida pública foi passada à administração do Tesouro Nacional.
O BCB passou a ter como principais objetivos assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda, garantir um sistema financeiro sólido e eficiente e fomentar o pleno emprego.
No entanto, ao longo dos anos, observou-se um desvio de finalidade em sua atuação. A função primordial de regulamentar e fiscalizar o sistema financeiro, combatendo abusos e a formação de cartéis, tem sido ofuscada por um foco desproporcional na interferência e subordinação da gestão do orçamento público, buscando a realização permanente de superávit primário e políticas de austeridade fiscal que favorecem a transferência de recursos públcos do orçamento nacional e da arrecadação dos impostos para o voraz rentismo do cartel de bancos que deixou de ter como finalidade o crédito e emprestimos para se locupletar com a transferência de recursos do Estado para os cofres privados do Cartel.
As funções sociais do BC e sua subordinação ao Conselho Monetário Nacional
Regulação e Supervisão do Sistema Financeiro: O BCB deve garantir que as instituições financeiras operem de forma segura e saudável, protegendo os consumidores contra práticas abusivas e evitando a formação de cartéis que distorçam a competição e prejudiquem a economia.
Estabilidade Monetária: Manter a inflação sob controle é vital para assegurar o poder de compra da moeda, promovendo um ambiente econômico estável, mas não pode ser um fim em sí mesmo, isto é, às custas da subordinação da nação e seu desenvolvimento soberano aos ditames de uma oligarquia financeira que formou cartel para parasitar a poupança e o trabalho da Nação, impedindo e bloqueando seu desenvolvimento.
Fomento ao Pleno Emprego: A política monetária deve priorizar o desenvolvimento nacional com justiça social e o impacto da política monetária sobre o emprego, buscando um equilíbrio que favoreça o crescimento econômico inclusivo.
Subordinado ao Conselho Monetário Nacional: A política de desenvolvimento do Brasil é formulada pelo governo eleito pela vontade popular aferida em eleições livres e democráticas, e através do Presidente da República e seus ministros, organizar o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL a quem compete
O Desvio de Finalidade
Apesar de suas atribuições iniciais, o BCB tem, nas últimas décadas, concentrado esforços em assegurar o superávit primário e implementar políticas de austeridade. Este desvio de foco pode ser observado em:
Foco no Superávit Primário: A busca incessante por superávit primário visa garantir que as receitas do governo superem as despesas, excluindo os pagamentos de juros da dívida pública. Embora importante para a saúde fiscal, essa prática frequentemente sacrifica investimentos públicos em áreas como saúde, educação e infraestrutura, essenciais para o desenvolvimento sustentável do país.
Foco no Arrocho Fiscal: As políticas de austeridade têm imposto severas restrições orçamentárias, resultando em cortes nos gastos públicos. Enquanto essas medidas são justificadas como necessárias para evitar crises fiscais, elas frequentemente agravam desigualdades sociais e retardam o crescimento econômico.
Foco no Benefício ao Rentismo: A manutenção de taxas de juros elevadas favorece investidores que se beneficiam da dívida pública remunerada a altos rendimentos. Este fenômeno é conhecido como rentismo, onde o lucro é gerado não pela produção ou inovação, mas pela exploração de altos juros sobre a dívida pública.
Consequências do Desvio de Finalidade e o Impacto na Economia Real
O desvio de finalidade do BCB tem várias repercussões negativas:
Transferencia de Trilhões de reais dos cofres públicos e das políticas públicas para os cofres do Cartel dos Bancos e seus associados.
Redução do Investimento Público: Com foco no superávit primário, o governo reduz investimentos em infraestrutura e serviços públicos essenciais, prejudicando o crescimento econômico e a qualidade de vida.
Aumento das Desigualdades: As políticas de austeridade frequentemente impactam de forma mais severa as populações mais vulneráveis, exacerbando as desigualdades sociais e econômicas.
Enfraquecimento da Regulação Financeira e das leis Anti Trustes: A ênfase excessiva na política fiscal pode reduzir a atenção e os recursos destinados à regulação e supervisão do sistema financeiro, permitindo práticas abusivas e a formação de cartéis que prejudicam a economia.
Desvio de finalidade em Benefício ao Setor Financeiro
Rentismo: As altas taxas de juros favorecem investidores que lucram com a dívida pública, em detrimento da economia produtiva. Essa perda de autonomia do BC, passando seu controle efetivo, para as mãos do Cartel dos Bancos, fez explodir a dívida pública, usada permanentemente pelo Cartel para extorquir e chantagear os Presidentes eleitos a aceitar a subordinação da República ao poder do Cartel dos Bancos.
Desvio de Recursos: Recursos que poderiam ser investidos em áreas produtivas acabam direcionados ao pagamento de juros, limitando o potencial de crescimento econômico.
Caminhos para a Reorientação do Banco Central
Para alinhar o Banco Central do Brasil com sua finalidade original, algumas medidas são necessárias:
Garantir e Retomar o Controle e a verdadeira autonomia do Estado sobre o BC e a política Monetária Nacional Soberana, impedindo que o BC tenha vinculos de subordinação com o Cartel dos Bancos.
Estancar a chantagem e a sangria dos recursos públicos para enriquecimento do Cartel dos Bancos.
Promover o Reequilíbrio de Prioridades: É crucial que o Estado reorganize o BC para um equilíbrio entre a gestão fiscal e a regulação do sistema financeiro, garantindo que a proteção ao consumidor e a promoção de um ambiente financeiro competitivo não sejam negligenciadas e subordinadas ao ditames do cartel dos Bancos.
Acelerar a Redução progressiva das exorbitantes Taxas de Juros: Uma política de juros mais baixa pode estimular o investimento produtivo, ao invés de incentivar o rentismo, o que ameaça a geração do progresso do país em detrimento da voraz concentração da riqueza nacional nas mãos do Cartel dos Bancos
Fortalecimento da Regulação Financeira: Aumentar a fiscalização sobre instituições financeiras para prevenir práticas abusivas e garantir um mercado justo e eficiente e o desmonte e punição a formação de cartel e práticas abusivas.
Políticas de Crescimento Inclusivo: O BCB deve considerar o impacto de suas políticas sobre o emprego e facilitar o crescimento econômico, impulsionar o crédito a juros baixos, buscando promover um desenvolvimento sustentável e inclusivo.
O desvio de finalidade do Banco Central do Brasil é uma questão que demanda atenção urgente. A Nação precisa reorientar suas políticas monetária e fiscal para garantir o desenvolvimento nacional e dar estabilidade ao país controlando o poder abusivo do sistema financeiro, combatendo as práticas abusivas e promovendo um crescimento econômico inclusivo. Apenas com um Banco Central atuando em conformidade com sua missão original será possível construir uma economia mais justa e equilibrada, que beneficie toda a sociedade brasileira.
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