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A ENGENHARIA DO CONHECIMENTO E A POBREZA INTELECTUAL NA ERA DAS REDES SOCIAIS DOS MONOPÓLIOS

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Amarrações entre Conteúdo, Forma e o Consumo Automatizado do Conhecimento


"Se se quer conhecer o gosto de uma pêra há que transformá-la, prová-la. Se se quer conhecer a estrutura e as propriedades do átomo, há que entregar-se a experiências físicas e químicas, modificar o estado do átomo. Se se quer conhecer a teoria e os métodos da revolução, há que participar na revolução. Todos os conhecimentos autênticos resultam da experiência direta."  - Mao Tse Tung - Essa frase icônica está presente em seu famoso ensaio filosófico "Sobre a Prática" escrito em julho de 1937.



Por Miguel Manso


Este artigo analisa criticamente o fenômeno contemporâneo da subordinação do conhecimento às lógicas estéticas das redes sociais, a pobreza intelectual de quem amarra o conteúdo à forma e o conhecimento à estética consumista e automatizada das redes. Argumenta-se que a associação sistemática entre conteúdo e formatos consumistas automatizados representa uma forma de pobreza intelectual que limita a capacidade crítica, aprofunda a ignorância sistêmica e transforma o conhecimento em commodity estetizada. Examinamos como plataformas como TikTok e Instagram promovem uma “epistemologia da instantaneidade” que prioriza a forma sobre a substância, gerando o que denominamos "TikTok teórico" - uma simulação de conhecimento desprovida de profundidade. Concluímos que a resistência a esta corrente exige práticas educativas e comunicacionais contra-hegemônicas que restaurem a complexidade do pensamento.

Não precisamos de “Tik Tok teórico”. 

É necessário remar contra a corrente da ignorância sistêmica e do consumo sem pensar.


O século XXI testemunhou a emergência de um paradoxo epistemológico: nunca houve tanta informação disponível, mas nunca o pensamento crítico pareceu tão ameaçado.

Nas redes sociais digitais, assistimos à transformação do conhecimento em produto estético, onde a forma audiovisual impactante supera em valor a profundidade conceitual. Esta "estetização consumista do saber" representa não apenas uma mudança nos formatos comunicacionais, mas uma transformação estrutural na relação entre os sujeitos e o conhecimento.

Este artigo desenvolve a tese de que a subordinação do conteúdo às exigências formais das plataformas digitais gera uma pobreza intelectual sistêmica, caracterizada pela superficialidade, pela substituição da argumentação pelo impacto sensorial e pela naturalização da ignorância como estilo comunicacional.




Da Epistemologia à Estetização: A Transformação do Conhecimento em Commodity


O Imperialismo do Formato

As plataformas de redes sociais não são meros canais neutros de transmissão, mas arquiteturas que impõem lógicas específicas de comunicação (Van Dijck, 2013). A formatação em vídeos curtos, a prioridade algorítmica para conteúdos que geram engajamento rápido e a economia da atenção criam um "imperialismo do formato" e o “imperialismo dos instintos selvagens”, onde apenas certos tipos de conhecimento são viáveis - aqueles que se adaptam às exigências de instantaneidade, impacto visual e react instintivo embrutecido.

Esta dinâmica produz o que podemos chamar de "conteúdo dietético": conhecimento reduzido a pílulas informacionais mastigáveis, desprovidas de contexto histórico, nuance argumentativa ou complexidade teórica. A consequência é uma ilusão de “aprendizagem” que mascara um esvaziamento cognitivo substantivo.


A Estética do Consumo Intelectual

A estetização das redes e do conhecimento superficial ou das fake segue as mesmas lógicas do consumo pós-moderno descritas por Baudrillard (1995): a primazia do signo sobre o referente, do simulacro sobre o real. 

Nas redes sociais, teorias complexas são reduzidas a "teorias coreografadas" - apresentações performáticas onde a estética do falante, os efeitos visuais e a musicalidade tornam-se mais importantes que a validade ou profundidade das ideias apresentadas.

Este fenômeno cria uma nova forma de capital cultural (Bourdieu, 1979) onde a aparência de inteligência substitui a inteligência mesma, e a capacidade de parecer um conhecedor supera o conhecimento efetivo.


O "TikTok Teórico" como Sintoma Epistemológico


Características do Conhecimento Estetizado

O que denominamos "TikTok teórico" apresenta características específicas:

  • Reducionismo complexo: Ideias multifacetadas são reduzidas a frases de efeito ou analogias simplistas

  • Velocidade substituindo a reflexão: A cadência acelerada impede o processamento crítico

  • Reação (ou react) instintual sobre a razão: A capacidade de gerar reações emocionais torna-se métrica de valor

  • Personalização excessiva: O conhecimento é apresentado como produto de personalidade acima do rigor metodológico

Consequências Epistemológicas

Esta transformação gera consequências profundas:

  • Empobrecimento da linguagem conceitual: Termos complexos perdem sua especificidade semântica

  • Fragilização da argumentação: A lógica discursiva é substituída por associações do instinto bruto

  • Naturalização da superficialidade: A incapacidade de sustentar pensamentos prolongados torna-se norma

  • Alienação epistêmica: Os consumidores de conhecimento tornam-se incapazes de distinguir entre compreensão real e ilusão de compreensão


A Ignorância Sistêmica como Produto do Consumo Automatizado


Da Ignorância como Falta à Ignorância como Sistema

A ignorância na era digital não é mais apenas ausência de conhecimento, mas um produto ativo de sistemas de produção e circulação informacional (McGoey, 2019). As redes sociais geram o que podemos chamar de "ignorância sistêmica": um estado onde a abundância de informação aliada à pobreza de contexto e profundidade cria uma paralisia cognitiva que simula conhecimento enquanto impede sua efetivação.

Automatização do Consumo Intelectual

A lógica do feed infinito e do conteúdo personalizado cria hábitos cognitivos automatizados que impedem a deliberação crítica. O conhecimento é consumido como entretenimento, seguindo os mesmos padrões de passividade e busca de gratificação imediata que caracterizam o consumo cultural pós-moderno.


Remar Contra a Corrente: Possibilidades de Resistência


Pedagogias da Complexidade

Contra a simplificação excessiva, são necessárias pedagogias que restaurem o valor da complexidade. Isso inclui:

  • Educação midiática crítica que ensine a desconstruir as lógicas das plataformas

  • Recuperação das temporalidades do pensamento contra a tirania da velocidade

  • Valorização dos processos sobre os produtos no aprendizado

Práticas Comunicacionais Contra-Hegemônicas

É possível utilizar as redes sociais de maneira contra-hegemônica através de:

  • Conscientização formativa: Explicitar as limitações dos formatos enquanto os utiliza

  • Estratégias de incompletude proposital: Conteúdos que apontem para fora da plataforma, reconhecendo seus limites

  • Comunidades de profundidade: Criação de espaços digitais que valorizem a discussão prolongada e a complexidade


Revalorização dos Meios "Lentos"

A resistência à pobreza intelectual exige também a revalorização de formatos e meios que permitam a profundidade: livros, artigos acadêmicos, debates prolongados, educação formal e informal que privilegie o processo sobre o produto.

A amarração do conteúdo à forma consumista das redes sociais representa mais do que uma mera adaptação tecnológica: é uma transformação epistemológica com consequências profundas para a capacidade crítica das sociedades contemporâneas.

O "TikTok teórico" sintetiza esta transformação, onde o conhecimento é esvaziado em favor de sua estetização.

Contra esta corrente, é necessário não apenas uma crítica, mas a construção de alternativas que restaurem a complexidade, a profundidade e a criticidade como valores centrais na circulação do conhecimento. 

Isso exige esforço coletivo - remar contra a corrente da ignorância sistêmica requer tanto práticas individuais de consumo consciente quanto transformações estruturais em nossas ecologias informacionais.

A pobreza intelectual não é destino inevitável da digitalização, mas produto de escolhas sociais e arquitetônicas que podem ser questionadas e transformadas. O desafio é reconhecer que, em um mundo de formas sedutoras, a substância do pensamento exige defesa ativa e renovada.


A Pobreza Intelectual na Era das Redes Sociais: Uma Análise Materialista-Histórica da Estetização Consumista do Conhecimento


Sob a perspectiva do materialismo histórico-dialético marxista, avaliamos a transformação do conhecimento em mercadoria estetizada nas plataformas digitais contemporâneas. Argumentamos que a subordinação do conteúdo às formas impostas pelas redes sociais corporativas representa uma expressão superestrutural da lógica do capital na fase atual de acumulação digital, gerando uma pobreza intelectual sistêmica que serve aos interesses da reprodução ampliada do capital.

Através de uma análise que articula infraestrutura técnica e superestrutura cultural, examinamos como plataformas como TikTok e Instagram operam como "fábricas de atenção" que convertem atividade cognitiva humana em valor e mais-valia, promovendo uma epistemologia da fragmentação que aliena os sujeitos de suas capacidades críticas. Concluímos que a resistência a esta corrente exige não apenas práticas educativas contra-hegemônicas, mas a compreensão das bases materiais desta transformação e a articulação com lutas mais amplas contra a mercantilização da vida.


A Mercadorização do Conhecimento Vulgar e das Fake na Fase Digital e imperialista do Capitalismo

O século XXI testemunhou a incorporação definitiva das esferas comunicativa e cognitiva ao ciclo de acumulação capitalista. Nas redes sociais digitais, propriedade de monopólios tecnológicos transnacionais, assistimos à transformação do conhecimento em mercadoria estetizada - uma forma mercantil peculiar onde o valor de troca (engajamento, dados, atenção) suplanta completamente qualquer valor de uso social coletivo e o rigor da verdade e do conhecimento real. 

Esta "estetização consumista do saber" não representa uma mera mudança cultural, mas uma transformação estrutural nas forças produtivas e relações de produção do conhecimento, analisável através das categorias do materialismo histórico-dialético.

A subordinação do conteúdo às exigências formais das plataformas digitais constitui uma contradição fundamental no modo capitalista contemporâneo de produção de conhecimento: ao mesmo tempo em que socializa a capacidade cognitiva humana em escala sem precedentes, a aprisiona em formas que a empobrecem, alienam e subordinam à valorização do valor. 

A pobreza intelectual sistêmica emerge assim como necessidade estrutural, não como acidente cultural.

A China acaba de exigir que os “influenciadores” para opinar sobre um assunto relevante devem ter formação e preparo científico reconhecido para tal.


Materialismo Histórico-Dialético Aplicado à Crítica Digital

Analisamos as plataformas digitais como instâncias materiais que articulam:

  1. Infraestrutura técnica (algoritmos, arquiteturas de dados, hardware)

  2. Relações de produção (trabalho cognitivo não remunerado, acumulação por vigilância)

  3. Formas de consciência (epistemologias da fragmentação, fetichismo do engajamento)

Rejeitamos tanto o determinismo tecnológico quanto o culturalismo idealista, insistindo na unidade dialética entre base material e produção intelectual.


As Plataformas como Fábricas de Atenção


A Forma-Mercadoria do Conhecimento Digital

As plataformas de redes sociais corporativas são, antes de tudo, mecanismos de extração de valor (Smicek, 2017). A formatação em vídeos curtos, a prioridade algorítmica para conteúdos que geram engajamento rápido e a economia da atenção constituem o processo de trabalho cognitivo típico do capitalismo de plataforma. O usuário produz valor através de:

  • Trabalho produtivo direto: Criação de conteúdo que atrai atenção

  • Trabalho produtivo indireto: Geração de dados comportamentais como matéria-prima

  • Trabalho de reprodução: Manutenção da plataforma como espaço social vital

Esta dinâmica produz o que podemos chamar, seguindo a teoria do valor de Marx, de "conhecimento como mercadoria fictícia" - desprovido de valor de uso substantivo mas portador imediato de valor de troca (atenção comercializável).


A Estética como Forma de Fetichismo do Conteúdo

A estetização do conhecimento segue a lógica do fetichismo da mercadoria (Marx, 1867) aplicado à esfera cognitiva. Nas redes sociais, teorias complexas são reduzidas a simulacros comerciais onde:

  • A forma (produção de valor) domina o conteúdo (valor de uso intelectual)

  • As relações sociais de produção de conhecimento aparecem como relações entre coisas (likes, shares, views)

  • O trabalho intelectual é alienado de seus produtores e apropriado pela plataforma

Este fenômeno cria uma nova forma de alienação epistemológica: os produtores-consumidores de conhecimento perdem a capacidade de reconhecer seu próprio trabalho intelectual no produto final estetizado.


O "TikTok Teórico" como Expressão Superestrutural da Base Material


Determinantes Materiais do Conhecimento Estetizado

O que denominamos "TikTok teórico" não é mera escolha estética, mas expressão necessária das condições materiais de produção intelectual nas plataformas:

  • Determinação algorítmica: A visibilidade é função da adaptação às métricas de engajamento

  • Tempo de circulação acelerado: Corresponde à aceleração geral da rotação do capital

  • Fragmentação: Espelha a fragmentação do processo de trabalho no capitalismo flexível

  • Personalização: Reflete a individualização própria da ideologia burguesa


A Contradição entre Socialização e Empobrecimento

Esta transformação manifesta uma contradição dialética característica:

  • Tese: Socialização sem precedentes dos meios de produção intelectual (plataformas acessíveis)

  • Antítese: Aprisionamento destas capacidades socializadas em formas que as empobrecem e as manipulam

  • Síntese potencial: Reconhecimento desta contradição como ponto de partida para práticas contra-hegemônicas


A Ignorância Sistêmica como Produto da desvalorização do Valor


A Produção Capitalista da Ignorância

A ignorância na era digital não é acidental, mas produto necessário do processo de acumulação. As plataformas produzem ativamente ignorância sistêmica porque:

  1. A profundidade crítica reduz a velocidade de circulação (e portanto a taxa de lucro)

  2. O pensamento complexo dificulta a padronização necessária à escala massiva

  3. A consciência histórica ameaça a naturalização do presente eternizado capitalista


A Automatização como Intensificação do Trabalho Intelectual

A lógica do feed infinito representa a linha de montagem taylorista aplicada à cognição:

  • Fragmentação das tarefas intelectuais em unidades mínimas

  • Ritmo imposto externamente pelos algoritmos

  • Controle permanente através de métricas de desempenho (engajamento)

  • Desqualificação do trabalhador intelectual, reduzido a reagir a estímulos


Remar Contra a Corrente: Práticas Contra-Hegemônicas Materialmente Fundadas


Pedagogias Materialistas da Complexidade

Contra a simplificação mercantil, são necessárias pedagogias que:

  • Desvelam as bases materiais da produção de conhecimento digital

  • Articulam crítica cultural com crítica política-econômica

  • Recuperam a temporalidade histórica contra o eternalismo do presente capitalista

  • Privilegiam o valor de uso coletivo sobre o valor de troca individual

Apropriação Contra-Hegemônica dos Meios de Produção Digital

Seguindo a perspectiva gramsciana de guerra de posição, é possível:

  • Criar plataformas cooperativas baseadas em lógicas não mercantis

  • Desenvolver ferramentas de desalienação que tornem visíveis os mecanismos de extração de valor

  • Construir redes de solidariedade cognitiva que resistam à competição individualizante

  • Experimentar com temporalidades alternativas à aceleração capitalista

Articulação com Lutas Materiais Mais Amplas

A resistência à pobreza intelectual deve articular-se com:

  • Lutas pela propriedade coletiva dos dados

  • Movimentos por renda básica que desmercantilizem o tempo

  • Campanhas por regulamentação democrática das plataformas

  • Experiências de autogestão do conhecimento fora das lógicas de mercado


Para uma Práxis Cognitiva Transformadora

A amarração do conteúdo à forma consumista das redes sociais representa a subsunção real do intelecto ao capital - fase em que o capital não apenas utiliza as capacidades cognitivas humanas, mas reorganiza sua própria natureza para melhor servir à valorização.

O "TikTok teórico" sintetiza esta subsunção, onde o conhecimento é esvaziado em favor de sua circulação como mercadoria. Contra esta corrente, não basta uma crítica cultural - é necessário compreender e transformar as relações materiais de produção que geram esta forma de conhecimento.

A pobreza intelectual é produto histórico das contradições do capitalismo cognitivo, não destino inevitável da tecnologia. Seu superação exige:

  1. Consciência das determinações materiais da produção intelectual

  2. Organização coletiva dos produtores de conhecimento

  3. Experimentação com alternativas concretas às plataformas capitalistas

  4. Articulação com o projeto histórico de emancipação humana integral

O desafio é reconhecer que, em um mundo onde o capital colonizou a cognição, o pensamento crítico exige não apenas reflexão, mas ação transformadora sobre as condições materiais que o tornam possível ou impossível. 

A luta contra a pobreza intelectual é, em última instância, luta pela reapropriação coletiva dos meios de produção estratégicos e dos meios de produção do conhecimento.



Miguel Manso é Engenheiro eletrônico formado pela USP, com especialização em Telecomunicações pela Unicamp e em Inteligência Artificial pela UFV, é diretor de Políticas Públicas da EngD – Engenharia pela Democracia.




TRECHO DE 

Sobre a Relação entre o Conhecimento e a Prática — A Relação entre Conhecer e Agir - Mao Tsetung - Julho de 1937


Para conhecer directamente um fenômeno ou fenômenos, é indispensável participar em pessoa na luta prática que visa modificar a realidade, esse fenômeno ou esses fenômenos, pois só participando pessoalmente em tal luta prática se torna possível entrar em contacto com o aspecto exterior do fenômeno ou fenômenos, só assim é possível descobrir a essência do fenômeno ou fenômenos, e compreendê-los. Tal é o processo de conhecimento que os homens seguem na realidade; só que alguns deformam deliberadamente os factos e pretendem o contrário. Os mais ridículos são os chamados "sabe-tudo", que, cheios de conhecimentos ocasionais, fragmentários, consideram-se "autoridades número um do mundo", o que comprova justamente a sua fatuidade desmesurada. O conhecimento é uma questão de ciência, não admite a menor desonestidade ou presunção. O que se requer é precisamente o contrário — honestidade e modéstia. Se se deseja adquirir conhecimentos, há que tomar parte na prática que transforma a realidade. Se se quer conhecer o gosto de uma pêra há que transformá-la, prová-la. Se se quer conhecer a estrutura e as propriedades do átomo, há que entregar-se a experiências físicas e químicas, modificar o estado do átomo. Se se quer conhecer a teoria e os métodos da revolução, há que participar na revolução. Todos os conhecimentos autênticos resultam da experiência directa. Mas o homem não pode ter uma experiência directa de tudo, razão por que a maior parte dos nossos conhecimentos é, na realidade, o produto duma experiência indirecta, são conhecimentos que nos vêm de todos os séculos passados, ou conhecimentos que foram adquiridos por homens doutros países. Esses conhecimentos são o produto da experiência directa dos nossos antepassados, ou da experiência directa de estrangeiros. Se, durante a experiência directa dos nossos antepassados e estrangeiros, esses conhecimentos respondiam à condição de que falava Lenine, quer dizer, se eram o resultado duma "abstracção científica", se eram o reflexo científico de fenômenos com existência objectiva, tais conhecimentos são seguros; no caso contrário, não o são. É por isso que os conhecimentos do homem se compõem de duas partes: os dados da experiência directa e os dados da experiência indirecta. Contudo, o que para mim é experiência indirecta, permanece para os outros experiência directa. Segue-se daí que, falando dos conhecimentos no seu conjunto, pode dizer-se que nenhum conhecimento pode ser desligado da experiência directa. A fonte de todo o conhecimento são as sensações recebidas do mundo exterior objetivo, pelos órgãos dos sentidos do homem. Os que negam a sensação, a experiência directa, a participação pessoal na prática que modifica a realidade, não são materialistas. Essa a razão por que os "sabe-tudo" são tão ridículos. Os chineses têm um velho provérbio que diz: "Se não se penetra no covil do tigre não se lhe podem apanhar as crias." Esse provérbio é verdadeiro para a prática humana e, na mesma medida, para a teoria do conhecimento. O conhecimento desligado da prática é inconcebível.


Palavras-chave: Pobreza intelectual, redes sociais, consumo de conhecimento, estetização, epistemologia digital, Tik Tok teórico, materialismo histórico, marxismo, capitalismo de plataforma, mercadoria conhecimento, alienação intelectual, valor cognitivo.




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