top of page

Um projeto para a Via Raposo Tavares no seu trecho Urbano. Nova Raposo?

Ivan Maglio

Por Ivan Maglio*


O debate sobre o projeto da Nova Raposo do KM 09 ao KM 34 está deixando a análise do problema de mobilidade urbana desse trecho urbano da via entre Cotia e São Paulo cada vez mais atual. Está claro que o projeto apresentado pelo governo estadual é antiquado e de cunho rodoviarista e que causaria enormes impactos ambientais, sociais, urbanísticos e climáticos, mas sem nenhum ganho efetivo para minimizar o problema dos constantes congestionamento na via, em especial nos horários de pico.

 

A Rodovia Raposo Tavares no trecho Cotia – São Paulo tem um volume diário de veículos de aproximadamente 45 mil veículos dia em cada direção, ou seja, 90 Mil veículos dia no total. A maior parte desse tráfego, cerca de 85% são compostos de veículos leves (carros)) e o restante são veículos comerciais (caminhões, caminhões e demais veículos de carga).

 

As pistas da rodovia com o atual número de faixas de tráfego, inseridas na sua faixa de domínio com cerca de 40 metros de largura apresentam-se saturadas. Para ampliar sua capacidade o governo estadual escolheu um projeto, que ampliaria essa faixa de domínio em cerca de 15 a 20 metros para cada lado, e para tal exigiria grandes desapropriações de imóveis e supressão de cerca de 1.000 árvores e 10 mil lotes atingidos segundo dados levantados pelo Movimento Nova Raposo, Não! A área já impermeabilizada para a atual rodovia receberia mais de 1,100 milhão de metros quadrados de novas impermeabilizações e ampliaria o volume de tráfego para cerca de 118 mil veículos por dia (59 mil veículos em cada direção), trazendo um enorme acréscimo de poluentes em decorrência desses aumentos de tráfego no interior da malga urbana densamente urbanizada.

 

Mas se o grande volume atual da rodovia são os veículos de transporte individual, a questão da mobilidade urbana deveria ser o foco principal de uma nova proposta. O que de fato seria uma solução é dar uma alternativa moderna e eficaz para a questão da mobilidade urbana. Os ônibus que trafegam pela rodovia têm origem em vários municípios da região oeste da RMSP com destino a São Paulo. Nesse contexto, nem mesmo um sistema de corredores de ônibus troncalizado e integrado foi previsto até o momento, o que mostra o desinteresse dos idealizadores do projeto em atender prioritariamente o transporte coletivo, privilegiando o transporte individual e indo na contramão do que se prática nas principais metrópoles mundiais.

 

Para desmotivar o uso do transporte individual, a oferta de um serviço de mobilidade urbana de alta qualidade seria a solução adequada, somada a melhorias com intervenções físicas e operacionais na rodovia com o uso das novas tecnologias atualmente disponíveis e com um pequeno alargamento de aproximadamente 10 metros (5 metros para cada lado) na sua faixa de domínio, a inserção de um sistema de transporte de média capacidade movido a energia limpa e com elevado padrão urbanístico, fugindo da atual proposta que propõe a ampliação da área da faixa de domínio rodoviária de 40 metros para um número ainda não conhecido de forma a caber um número maior de pistas e, consequentemente um número ainda maior de veículos, com todos os impactos dessa decisão, seja na implantação e na operação com a ampliação do volume de poluentes e com aumento do volume de tráfego para a marginal do Pinheiros e para vias já saturadas da cidade. Seriam 25 km de marginais contínuas e 6 pontos de cobrança de pedágio, e a um custo estimado de até 9 milhões conforme divulgação oficial. As mudanças anunciadas até agora pela SP Parcerias mudam pequenos aspectos do traçado para atender a pressões localizadas mas não alteram a concepção rodoviarista e os grandes impactos do projeto.

 

Essa opção é o que chamamos de urbanismo rodoviarista que teve sua pujança nos anos 1950, mas que não fazem mais o menor sentido atualmente no século 21 onde precisamos de maior resiliência da cidade, mais permeabilidade e menos emissões de gases de efeito estufa e de outros poluentes para enfrentarmos como todos os habitantes do planeta a crise climática.

 

São Paulo, Estado e cidade assumiram diversos compromissos com a redução das emissões de gases de efeito estufa para reduzir o aquecimento global e com a sustentabilidade que conflita claramente com o projeto rodoviarista ora proposto para a ampliação da via como se esta fosse apenas mais uma rodovia Raposo Tavares no seu trecho Urbano. Nesses cerca de 25 quilômetros a rodovia se transformou numa via urbana rodeada por edificações verticais, bairros de alto, médio e até baixo padrão, parques e áreas verdes conservadas a duras penas pelas comunidades e ambientalistas como o Parque da Previdência, num tecido urbano que busca cada vez maior qualificação, sustentabilidade e resiliência urbana. Alia-se a isso a questão do aumento da arrecadação via implantação de um pedágio urbano no trecho de 25 km atualmente inserido na malha urbana!

 

Um projeto moderno de mobilidade urbana de média capacidade que transportasse até 35 mil passageiros por dia já resolveria o problema com muito menos impactos ambientais e com melhores resultados urbanísticos, sociais e ambientais. A equação do pedágio é uma política pública que para áreas urbanas ainda demanda um maior debate, mas, tarifas opcionais e a tarifa zero vem sendo discutidas e praticada nos projetos modernos de mobilidade urbana.

 

Aí a gama de opções estaria entre o BRT – Bus Rapid Transit (Corredores de ônibus de grande capacidade) e os Veículos Leves Sobre Trilhos – VLT. Essas alternativas apresentam diferente vantagens e desvantagens, mas são capazes de transportar 35.000 passageiros por dia em cada direção, com a vantagem de reduzir substancialmente o uso do carro como alternativa para os deslocamentos com fins urbanos. Temos ainda a discussão do metrô que transportaria cerca de até 90 mil passageiros por dia, mas que apresenta a necessidade de uma demanda que viabilize sua implantação. Se o Governo do Estado discute essa alternativa com a possibilidade de implantação da linha Marrom 22 de Cotia a São Paulo, deveria apresentar esses números de forma séria e consequente como opção de mobilidade urbana. Sabemos que essas opções têm tempos de maturação diversos, os primeiros de médio prazo, e o metrô de longo prazo.

 

Particularmente minha opinião é que o VLT apresenta muitas vantagens e modernidade suficiente para se apresentar como potencial para a solução do problema colocado para melhorar as condições de mobilidade urbana nesse trecho de 25 Km dentro da região oeste densamente urbanizada da metrópole paulistana. Um Estudo de Impacto Ambiental – EIA é o instrumento previsto na legislação ambiental brasileira para a discussão das alternativas tecnológicas com maior viabilidade ambiental e urbanística ´para resolver o problema. Há um claro retrocesso na aplicação da lei e das regras ambientais democráticas duramente conquistadas com o capítulo de meio ambiente na Constituição de 1988, e recebeu-se um projeto rodoviarista que não se sustenta e que nem sequer apresenta os estudos em que se baseou.

 

A quem está servindo esse projeto rodoviarista que faria sentido nos anos 1950, mas que no século 21 não faz mais nenhum sentido uma vez que causa impactos e só agravará a solução social, urbana, ambiental e climática!


* Ivan Maglio é engenheiro civil, doutor em Saúde Pública e pesquisador em Mudanças Climáticas e Planejamento Urbano pelo IEA (Instituto de Estudos Avançados) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. É membro do Conselho Deliberativo da EngD (Engenharia pela Democracia).

תגובות


bottom of page