EngD subscreve carta do Ondas
- EngD
- 21 de jun.
- 4 min de leitura
Carta à ABNT para não normatização do projeto “...captação de águas residuárias em sistemas de drenagem pluvial em ...tempo seco”

O Ondas - Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento tomou conhecimento dos trabalhos da ABNT-CB-177-CE 177 001 001_Projeto Norma CE 177 001 001 006- que trata de “Projeto de estruturas de captação de águas residuárias em sistemas de drenagem pluvial em período de tempo seco” quando já existia um texto em vias de ser submetido a consulta nacional. Face aos compromissos da instituição com os direitos à água e ao esgotamento sanitário e a efetiva universalização dos serviços de saneamento e por considerar o assunto de natureza polêmica e delicada, que merece cuidadoso aprofundamento antes de uma normalização brasileira, realizou um evento técnico no mês de fevereiro de 2025 e um curso remoto com 4 encontros técnicos no mês de maio de 2025, para debater o tema e o texto preliminar de norma que foi disponibilizado pela ABNT. Também produziu uma nota técnica tratando do tema, que pode ser acessada aqui.
A análise do texto preliminar possibilitou identificar uma série de problemas, alguns de caráter estrutural na sua proposição. Podem ser citados:
Na parte de definições, apresenta-se o sistema separador absoluto, equivocadamente, como aquele que conduz exclusivamente águas residuárias, ou seja, um tubo que contém esgoto. O sistema separador absoluto é composto por duas tubulações: uma para águas residuárias e outra para as águas pluviais. O equívoco nesta definição leva a um entendimento distorcido do texto de norma;
A definição do “sistema misto”, no projeto, iguala-o ao “sistema unitário”, não se pode dizer ser apenas uma questão de semântica. O “sistema misto”, ocorre quando em uma parte da cidade existe “sistema separador” e em outra “sistema unitário”.
Sobre as condições hidráulicas de funcionamento, o texto preliminar de norma não explicita como será assegurado o escoamento em superfície livre (sem pressão) das tubulações que conduzem as águas contidas nos sistemas pluviais para tratamento e destino final. Caso essas tubulações venham a entrar em carga, como conduto forçado, nos momentos de chuva intensa pode haver comprometimentos da tubulação e do sistema. Tampouco se esclarece como será assegurada a existência da chamada “tensão trativa”, responsável pelo arraste de sólidos e matéria orgânica nas tubulações de conexão entre as águas pluviais e o sistema de tratamento. A necessidade de assegurar declividades mínimas e de eventualmente prever estruturas de bombeamento para correto funcionamento do sistema não chega a ser abordada.
Não são claramente explicitados os casos em que se admite a utilização do sistema de captação em tempo seco;
Não são considerados os problemas de corrosão do concreto, associado à presença de esgotos nas galerias de águas pluviais;
Não são adequadamente abordadas as rotinas de manutenção do sistema, que são essenciais para seu funcionamento.
Não são previstos prazos máximos para utilização, de forma segura, do sistema de captação em tempo seco, até que se consiga viabilizar a efetiva implementação do sistema separador absoluto, com tratamento dos esgotos inclusive nos períodos chuvosos.
Ao debater o tema surge a preocupação com as comunidades mais vulneráveis e com o risco de que a captação em tempo seco seja utilizada como um subterfúgio para adiar, indefinidamente, os esforços necessários para execução do sistema separador absoluto, com implantação e ligação domiciliar nas redes coletoras de esgotos, condição fundamental para que os esgotos sejam tratados inclusive nos períodos chuvosos e necessário também para viabilizar a efetiva universalização, na conceituação considerada mais adequada na ótica da saúde pública.
Face a esses problemas, os técnicos abaixo assinados sugerem que seja reconsiderada pela ABNT a pertinência da preparação de uma norma brasileira, considerando inclusive os riscos associados à normalização de uma solução que se deseja que tenha apenas caráter paliativo, emergencial e temporário. Considera-se que outros temas associados, como por exemplo, a regulamentação técnica das atividades de interceptação de esgotos nos sistemas pluviais, poderiam ser priorizados, como por exemplo, “programa caça esgoto”.
Insistimos na necessidade da não normatização da solução em epígrafe, sob o risco de tornar solução definitiva, porém, caso se mantenha a intenção de preparação de uma norma na temática, considera-se fundamental que se amplie o debate e que se alargue a composição dos técnicos envolvidos na sua proposição, para que sejam incluídas mudanças estruturais que se fazem necessárias no texto normativo. Propõe-se ainda que seja incentivada e ouvida a opinião de entidades de engenharia como o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), órgão máximo responsável pela normatização e fiscalização em nível nacional; os Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (CREAs) e as Câmaras Especializadas, órgãos dos CREAs que analisam e julgam questões técnicas e éticas relacionadas às diferentes áreas da engenharia. A realização de seminários, rodas de conversa e oficinas seria muito salutar para aprofundar o debate.
A história de respeito construída pela ABNT desde os anos 1940 não pode ter sua reputação prejudicada nem manchada sua credibilidade por uma norma que, claramente, está longe do consenso entre técnicos e suas entidades.
FAÇA SUA ADESÃO À CARTA.
Acesse: tinyurl.com/cartaabnt
Comments